Ele precisava dar um jeito de fazer Dante desistir de Ivy, antes que ele descobrisse a sua verdadeira identidade, se isso acontecesse seria o fim de tudo, quem tentou enganar o Rei do Inferno não viveu para contar quais foram seus motivos para tal loucura. Ian não queria entrar naquele jogo, mas foi obrigado e agora sua vida estava por um fio.

Antes de tudo ele precisava realmente pedir demissão, ele sabia que Ivy poderia fazer isso por ele, que se ele aparecesse travestido no escritório teria toda a audácia de mandar todo mundo se foder, mas ele temia que Dante descobrisse que Ian e Ivy moravam na mesma casa e assim o seu segredo podia ser revelado, já que os seus homens já haviam invadido a residência do jovem rapaz na calada da noite. 

“Como posso leva Ivy até o escritório sem que ela seja notada?”

Era um grande dilema que precisava ser resolvido urgentemente, Ian não tinha condições de perder mais uma noite de sono, ele estava estressado e completamente exausto, mas sua mente ainda parecia ter um pouco de energia e ele encontrou algo que poderia ser a solução. Ivy havia ganhado várias roupas de Dante e muitas delas tinham aspectos neutros ou unissex, talvez se ele se vestisse como ela, ganharia um pouco da sua coragem, ele não precisava de toda a sua audácia, não precisava xingar todo mundo e quebrar tudo, só precisava pedir demissão e se livrar daquele lugar infernal.

Pela primeira vez em anos Ian se arrumou de verdade para ir ao trabalho, afinal Ivy nunca aceitaria sair desarrumada, ele ajeitou o cabelo com um gel caro, passou maquiagem para mascarar suas olheiras e um perfume de sândalo, vestiu uma das lingeries que ainda estava com etiqueta, era a segunda vez que ele vestia uma roupa íntima feminina, o que não era tão desconfortável quanto ele achava que seria, já que ele não poderia usar muita coisa aparente, seu visual era composto por uma calça de linho preta de cintura alta e uma camisa também preta de botão que ele colocou por dentro e deixou alguns botões abertos, mas não muitos para que o sutiã não aparecesse, ele também dobrou as mangas longas até os cotovelos e calçou um mocassim preto sem detalhes, seu look era composto completamente por peças ditas femininas, mas ele estava bem neutro e se sentia à vontade para se comportar como Ivy, ou mais ou menos isso.

Ivy nunca pegaria um ônibus lotado, ou deixaria que as pessoas passassem na sua frente na hora de entrar em qualquer lugar, mas Ian precisava guardar sua energia para despejar tudo no RH e pedir sua demissão, dessa forma ele poderia pensar com clareza na melhor forma de sair das garras de Dante.

O caminho para o trabalho foi o mesmo de sempre, mas Ian foi tratado diferente, certamente por ter uma pitada da essência de Ivy ele recebeu vários olhares, as pessoas foram mais educadas e ele recebeu até uns cumprimentos de “bom dia” em tons insinuantes, o efeito que algumas pequenas mudanças em seu visual causou, deixou Ian mais relaxado, agora ele se sentia realmente capaz de se livrar de seu emprego de merda.

A chegada ao escritório não foi tão calma como o usual, passar despercebido não era uma opção, por mais que seu visual fosse um pretinho básico e discreto, Ivy sempre brilhava, o fenômeno chamou atenção de todos gerando vários cochichos, mas a única pessoa que foi falar com ele foi Samanta, como sempre.

— Uau, Ian você está incrível hoje! — disse ela com um largo sorriso mostrando suas covinhas assim que Ian sentou-se na mesa ao seu lado – Você tem alguma reunião importante...? — ela fez uma pausa e acrescentou baixinho — Ou quem sabe um encontro? 

— Não, nada disso — disse ele devolvendo o sorriso — Hoje é o dia.

— Ah que bom! — disse ela aliviada — Digo, que bom que você está decidido, eu vi como você estava angustiado nos últimos dias, eu estava realmente preocupada com você.

— Obrigado, Sam! — disse ele tocando no ombro dela e dando um leve aperto — Você é uma boa amiga. — ele se levantou e cruzou os dedos — me deseje sorte.

— Boa sorte! — disse ela baixinho, mas em um tom animado.

O corpo de Ian ainda tremia e seu coração ainda batia forte, seu nervosismo ainda parecia querer consumi-lo de dentro para fora, porém agora ele tinha pego um pouco de coragem emprestada e conseguiu entrar na sala do RH, não houve gritos, nem xingamentos como no sonho do outro dia, mas ele foi capaz de pedir demissão sem precisar do aviso prévio.

O expediente se passou normalmente, mas a carga pesada de trabalho não parecia tão extenuante dessa vez era como se um imenso peso tivesse sido removido de seus ombros, mas não totalmente, ainda tinha um imenso problema de 1,85 m de altura que poderia acabar com a vida dele a qualquer momento se ele fizesse um movimento errado, mas nesse momento ele iria se permitir sentir o gosto da pequena vitória.

No final do expediente Ian recolheu os poucos pertences pessoais que ele tinha no escritório e se dirigiu para a saída quando uma colega o chamou.

— Então é realmente verdade o que estão dizendo? Você pediu demissão? 

— Sim, você nunca mais terá o desprazer de me ver — disse Ian com um sorriso.

— Credo, Ian — disse ela rindo e pegando o braço dele com delicadeza — Não fale assim, por que eu não posso mais te ver? Que tal uma festinha de despedida? A gente se reúne no bar com o pessoal, come e bebe um pouco, o que acha?

— Você acha mesmo que eu quero socializar com um bando de babacas como vocês? — riu Ian afastando o toque da moça, ele segurou a mão dela com mais força que deveria, porém, para quem olhava de longe eles pareciam ter uma conversa tão íntima que podia ser facilmente confundida com um flerte — Nunca fiz isso enquanto trabalhava aqui, por que faria isso agora?

Ela ficou olhando para Ian sem saber o que dizer, enquanto ele se afastava sem dizer mais nenhuma palavra. 

“Chupa rebanho de corno, eu estou livre de vocês e desse lugar de merda.”

O elevador logo abriu as portas e Ian entrou ostentando um grande sorriso, ele apertou o botão referente à saída com imensa satisfação, encarou seu reflexo no espelho, ajeitou a manga que sua ex-colega havia bagunçado e disse picando com um olho:

— Eu disse que você ia conseguir, Ian.