A sala do trono era um dos maiores cômodos do castelo de Aredamon, onde o rei costumava passar grande parte do seu dia. Era lá onde recebia as pessoas para ter conhecimento de seus problemas, resolver questões, sendo elas brigas, desentendimentos e outros. Além de que, também era lá onde se julgava aqueles que não agiram corretamente.
Ao seu lado estava o padre, o qual cuidava da parte religiosa direcionando o soberano, dizendo o que era certo e o que era errado, e claro, ajudando-o a ser mais próspero. Mas ainda sim, não tomavam as melhores das decisões, pois faziam o que queriam sem se preocupar em como iriam afetar a vida dos demais, principalmente daqueles que não possuíam riquezas, sempre dispostos a tirar vantagem. Oh, sim... É tão detestável ver alguém usar o nome do nosso senhor em vão, trazendo uma má imagem a aquele que sempre está olhando por nós...
Além disso, era uma sala bem bonita e agradável, com diversas janelas bem arquitetadas para deixar o local harmonioso e iluminado. Também haviam cortinas de veludo vermelhas como o vinho, com cordas douradas que as amarravam durante o dia. Candelabros sobre cômodas esculpidas em galhos de rosa, organizados entre cada janela. Um tapete vermelho delicado dando caminho da porta ao trono, e sim, três assentos, o maior para o rei e outros dois mais delicados, quais eram para cada uma das duas rainhas. Também entre os assentos se encontravam dois servos, que estavam lá para servir vinho e frutas ao rei. No canto da frente ficavam dois guardas, os quais deviam estar de pé prontos para defender seu rei, e dois do lado de fora em cada lateral da porta. Decoravam a sala com bandeiras do reino, tendo a imagem de galhos espinhosos e uma rosa ao meio, sendo ela branca e iluminada; já devem ter notado o quanto gostavam dessa flor.
O rei levantava seu cálice de ouro para que seu servo o enchesse, logo o trazendo de volta para si, rodando o líquido como se tentasse o misturar bem, e tomando um gole. Apreciava bem seu sabor, dando um longo suspiro e colocando a taça na bandeja.
Coçou sua grande barba grisalha por alguns instantes, encarando as duas lindas donzelas que estavam em sua frente. Ambas prostradas, implorando por misericórdia, enquanto o homem se divertia com tudo aquilo.
Levantou-se e caminhou até elas, parando em frente e logo ganhando o olhar das duas. Apoiou as mãos na cintura e deu um suspiro, assim começando a falar:
— Me entristece ver tamanha beleza desperdiçada... — Havia ironia em seu tom, todavia, não mentia sobre elas serem muito bonitas. O problema era o porquê de estarem ali. Viu uma gota de suor escorrer pela testa de uma, estavam com tanto medo... — Mas o que fazer, não? Afinal, foram vocês que lhes trouxeram até aqui. — Se abaixou e pegou no queixo delas, não deixando com que olhassem para outro lugar. Tremiam, queriam chorar. Logo o homem as soltou e voltou para o trono, sentando-se e pegando o cálice mais uma vez, dando um gole demorado e assim voltando sua atenção a elas: — Levem-nas. Se afundarem, estarão livres da condenação eterna, agora se flutuarem, queimaram na fogueira e irão direto para o inferno.
— MAS SENHOR! TENHA MISERI... — O guarda puxou a mais jovem chacoalhando-a para que se calasse.
— Não levante a voz para sua majestade, garota insolente. — O rei se zangou. — Essa queimará na fogueira sem livrar-se da condenação eterna! Agora levem-na depressa antes que eu perca a paciência!
— OH, NÃO, SENHOR! — Implorava. — POR FAVOR!
— ME PERDOE, SENHOR. PERDOE-ME!
Perto da porta, antes que sumissem da vista do rei, a mais velha se virou e o encarou uma última vez, falando algo que o perturbou pelo resto do dia; mesmo que tentou disfarçar bem sua preocupação. De fato o guarda podia levá-la, só que o soberano ordenou que a deixasse terminar já que queria rir de suas palavras finais:
— Você sabe o porquê de estar fazendo isso... Sabe que não somos o que nos julga ser... Sua mente maligna e seu coração perverso arruinarão sua vida. Podemos até ser julgadas por uma escória como você, mas quando sua hora chegar, não seremos nós que encontrará no inferno. — E assim foi levada, sendo expulsa de lá a gritos, tendo sua sentença tão cruel quanto à da outra.
O homem queria tanto acabar com ela com suas próprias mãos, queria tanto fazê-la engolir aquelas palavras. "Quem ela acha que é?" disse ao mesmo tempo em que se sentava novamente, furioso.
Sendo assim, o padre se aproximou e tentou o consolar. Dizia que suas decisões eram sábias e suas palavras eram lei. Que um rei nunca errava, sendo perfeito e absoluto, do jeitinho que ele gostava de ouvir.
— Fez bem, meu senhor. — Se deliciava das uvas, quais eram doces como o mel, diferente do que sairia de sua boca. — Essas gentalhas não podem viver no mesmo mundo que nós. Meretrizes imundas...
— Que seja. — Revirou os olhos.
Não havia as condenado por realmente achar que faziam algo ilícito como o nome que o padre deu a elas, mas sim, chegou ao seu ouvido que estavam praticando magia negra durante as noites de lua cheia, raptando crianças e usando-as em seus cultos malignos. E claro, nada disso era verdade, afinal, as duas eram apenas servas de nobres, as quais zelavam por seus senhores e eram muito amadas pelas pequenas garotinhas que tinham de cuidar. Mulheres doces e gentis, calmas e serenas, não faziam mal a uma mosca, só que o fim delas não foi o mesmo que ofereceram ao mundo. Deram amor e receberam ódio, mas o que esperar, não? Se nem com o perfeito agiram de boa fé, imagine com nós que somos tão pequenos...
Logo voltou a falar, trocando de assunto: — Agora me diga... Senti falta do meu décimo filho. — Coçava a barba em dúvida. Tinha tantos filhos que mal conseguia se lembrar do nome do rapaz; engraçado, não? Sabia a ordem dos filhos mas sempre se perdia com os nomes. Nem dava muita importância para dizer a verdade, afinal, o primogênito era seu favorito. Algo que ele não escondia de ninguém. — Como se chama mesmo...?
— Dominic, senhor. O nome dele é Dominic. — Segurou o suspiro que daria, achava que aquela pergunta era estúpida, só que caso demonstrasse sentir isso, sabia que o rei não deixaria barato.
— Isso, exatamente esse. O que houve? — Apoiava o cotovelo no braço esquerdo do trono e se aproximava um pouco para frente mostrando interesse. Balançava a outra mão a girando: — Não me diga que continua frequentando as tavernas dos plebeus?
— Não sei ao certo. O vi sair mais cedo, mas estava tão atarefado que mal pude repará-lo.
— Hm... De qualquer forma, instrua-o a não se envolver com essas mulheres pecaminosas. Ele é um menino muito ingênuo, que se deixa levar pelas aparências. — Recordava-se de quando era jovem, logo dando um sorriso discreto, pois também se encantava com as belas damas do reino.
— Não se preocupe. Irei fazer o melhor que estiver ao meu alcance.
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Ashley sentia o frescor das águas cristalinas do lago molhar seus dedos, brincava com ela ainda em pé, segurando a saia de seu vestido. O dia estava quente, perfeito para que pudesse se banhar lá mesmo. Não estava sozinha, já que Luar costumava acompanhá-la para onde ia. Brincava com as borboletas, as mesmas que pousavam nas flores próximas a eles.
— Eu... — Ainda se sentia nervosa na presença do príncipe, logo respirou fundo antes de continuar: — Sei que está aí! Saia de trás desses arbustos e deixe de me espionar! — Olhou na direção dele, estava séria.
— Ah! — Dominic deixou de se esconder. — Como sabia?
— Quem mais viria com seu alazão espionar uma garota tentando se banhar?
— Ah... O Relâmpago... — Olhou para seu cavalo franzindo as sobrancelhas. Não que estivesse bravo com ele, mas ainda sim não queria que o mesmo revelasse seu esconderijo. — Vai pastar, vai. — Ouvindo aquilo, se virou e deu com o rabo no rosto do menino, revirando os olhos.
— Se não se importa... Vá com ele. Não quero molhar minhas vestes.
— Não pode fazer isso sozinha em um lugar como esse! Se alguém te vir, não resistirá aos seus encantos! — Tirou sua espada da bainha e a levantou fazendo uma pose heróica. —— Sendo assim, irei escoltá-la!
— Ninguém vem aqui! — O olhou furiosa. — Por acaso acha que sou uma tola? Além do mais... — Sua feição mudava, como se estivesse ficando tímida. Se deu conta do que o rapaz falou, assim, desviou o olhar e começou a mexer em seu cabelo o penteando com os dedos. —...não há encanto algum.
— Pois há sim! É a mais bela entre todas! — Dava passos até ela, aproximando-se devagar para que não a espantasse. — Graciosa e encantadora. — Sua voz era doce, pois não dizia de boca para fora. Realmente achava aquilo. Quando já estava próximo, colocou a mão na cintura dela e encarou seus olhos. — Não consigo deixar de pensar em você... E logo me lembro que nem ao menos me dissera seu nome... E eu me importo com isso, porque estou apaixonado por você.
Aquelas palavras a colocavam em apuros. Se esforçava para que não sorrisse, mostrando que também gostava dele daquela forma, e por mais que tentasse, não pôde aguentar e assim o fez. — S-Solte-me. — Gaguejou. Senti-lo tocar sua cintura a deixou nervosa, era tão ousado o jovem. Mesmo assim, não queria que ele a soltasse.
— Por que faria isso? — Aproximava o rosto, agora olhando para os lábios dela. Ela sabia o que aconteceria e não se sentia pronta para dar seu primeiro beijo, mesmo que seu coração dissesse que era ele quem o teria.
Ashley era uma moça criativa. Estava nervosa, de fato, entretanto, conseguiu pensar em uma saída. Deu alguns passos para trás, logo se virando e abaixando. Encheu as mãos de água e conduziu-as rapidamente em direção a ele assim jogando no rosto do príncipe. Dizia que aqueles eram seus encantos, o que tirou doces gargalhadas do mesmo, que se apressou até o lago e fez o mesmo.
Brincavam como duas crianças, rindo e sorrindo, até que o rapaz não resistiu e acabou por elogiar o belo sorriso da moça. Foi o suficiente para que ela o desfizesse e se reprimisse novamente. Segurou com uma mão no braço, enquanto o outro permanecia onde estava, desviando o seu olhar com as bochechas rosadas e logo coçando seu ombro.
— Oh... — Suspirou. — Se quer me escoltar... Então vá para o seu posto... — Direcionou seus olhos aos dele, que o deixou tão nervoso quanto ela. — Não irei demorar muito.
Confesso que ficou triste. Poderiam continuar brincando, se divertindo dentro das águas. Não tinha problema, já que por certo o rapaz só queria que ela o amasse. Nunca faria algo que ela não quisesse, só que sempre que estava perto de alcançar um de seus objetivos com a moça, sentia que fazia algo para estragar o momento.
E lá estava ele, sentado embaixo de uma árvore olhando para a direção oposta da menina. Havia coberto um lado do lago com sua capa, a qual era presa na espada dele e em um tronco, permitindo com que Ashley tivesse privacidade ao tirar suas vestes. Não estava nua, apenas com as roupas de baixo, que por sinal, eram bem comportadas.
Luar estava com ela, nadando em sua volta. Estava divertido, sim, contudo, sabia que estaria mais se o outro se juntasse. Não podia deixá-lo vê-la desse jeito, então tentou abandonar a ideia. Afundou-se nas águas, pensando no que dissera... Ainda não tinham por conhecimento o nome um do outro, e como para ele, aquilo era importante para ela.
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Haviam duas vilas no reino de Aredamon, a parte nobre e a parte pobre. E lá, no centro do lado dos ricos, duas pessoas caminhavam admirando cada construção. Uma delas era uma mulher que parecia ter entre trinta a quarenta anos, muito bonita por sinal. Tinha cabelos escuros e olhos claros. Quanto à outra, era uma menina de apenas dezesseis anos. Seus cabelos eram vermelhos como o fogo, olhos azuis como o mar e pele branca como a neve. Segurava um pequeno boneco de pano, abraçando-o.
— Oh... — Admirou o palácio, qual ficava próximo ao chatéau; uma espécie de castelo pequeno. — Que belo lugar para se viver, minha querida tia. — Dava um sorriso fraco, tentando alegrar a mais velha.
— Não se preocupe, minha doce Tifany. — Sorriu de volta, mostrando que se alegrava com o esforço da outra. — Teremos uma moradia ainda melhor do que a que costumávamos ter. O jardim é imenso e com certeza irão aparecer animais para lhe fazer companhia quando puder caminhar por ele.
— Não é isso o que me preocupa... — Tinha notado a falta dos pequeninos, de fato. Só que sabia que cedo ou tarde eles apareceriam.
— E então?
— Tenho medo de que ter tomado a decisão errada... E se ele me procurar onde costumávamos nos encontrar? E se por causa de nossas mudanças, nunca mais nos vermos novamente? E se...
— Oh, minha querida. Não perca a fé. — Colocou a mão sobre a cabeça da menina com delicadeza, logo acariciando seus longos cabelos vermelhos e tentando a confortar. — Não se lembra das maravilhas que me contou pouco antes de tomarmos essa decisão?
Acenou como sim, apertando o boneco ainda mais em seus braços. Queria continuar forte, mas era tão difícil... Repetiu aquele poema em sua mente, o mesmo que a mulher dos cabelos azuis como safiras escrevera para ela anos atrás. Era ele que a mantinha forte. Era ele que não a deixava se perder.
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